quinta-feira, 9 de maio de 2019


Sinto-me como um náufrago isolado em uma ilha deserta,  ou como um pregador no deserto, porém  não por meio de palavras faladas, mas pensadas em solilóquios  que transcorrem em pensamentos expressos em palavras escritas, como aquelas mensagens colocadas dentro de uma  garrafa e lançada ao imenso  mar, cujas ondas, ventanias e maremotos a direciona para lugares inimagináveis. Assim são meus escritos, como essa garrafa lançada ao mar e que,  em meio a sua imensidão,  fica a boiar, sem destino certo aonde chegar, sem nenhum alvo especifico a alcançar, porém, inevitavelmente,  a algum lugar ela deve chegar, custe o tempo que custar, e alguém a irá encontrar, seja quem for, quem sabe agora este não seja você, meu caro leitor.

Vivemos num mundo intoxicado e abarrotado de informações, de conhecimentos premeditadamente capilarizados por supostos especialistas pasteurizados, que disseminam suas convicções e certezas com pretensões déspotas, impondo subliminarmente padrões e paradigmas para os quais todos são induzidos a se submeterem. Somos bombardeados por livros de cujo  mercado editorial querem nos fazer mergulhar numa intoxicação mental e emocional. Ao contrário do senso comum e do que se apregoa, devemos ser criteriosos e seletivos ao máximo com o que lemos , pois devemos saber o que de fato é importante e fundamental para nosso desenvolvimento espiritual, emocional e intelectual. Devemos repudiar a tal paixão de ler, a compulsão desenfreada por uma desmedida e demasiada ânsia de leituras, pois se trata de ler de forma inteligente e não apaixonada, como diz Sertillanges. Devemos buscar conhecimentos em leituras aos quais pretendamos reter para o que de fato possa nos edificar e agregar a nossa vida em sua totalidade. Devemos privilegiar mais as leituras de formação do que a de informação, para que não nos transformemos em um depósito cerebral ambulante.
 O mundo quer nos sobrecarregar com uma carga absurda de informações numa frenética e incansável busca por saberes, que visam muitas vezes a atender egos, vaidades ou a um vazio existencial as quais as autoajudas prometem preencher com os seus gurus.

Devemos ter bom senso e não devemos nos alienarmos a nós mesmos , entregando-nos de bandeja para esta atualidade deturpada. Essa cultura atual quer apoderar-se de nossas mentes preenchendo-a com seus barulhos insonoros alienadores e assim devorar nosso silêncio interior, nos impedindo de escutarmo-nos em nosso silêncio pelo espirito que nos edifica e liberta, que nos confere autonomia e uma existência peculiar e original.

Querem nos sufocar com conhecimentos sucateados e fazer de nós latas de lixos mentais ambulantes, meros receptores de dejetos e excrementos intelectuais.
Devemos beber das fontes, frequentar a elite dos pensamentos, as ideias mestres e atemporais que transcendem gerações, pois são verdades eternas  que permitem que delas extraiamos não apenas conhecimentos, mas, entendimento,  sentimento, espiritualidade e sabedoria.
Estas verdades quando de nós se apossa, desliza em nossa alma erguendo-nos para as regiões mais elevadas da solidão, do espírito e do silêncio, onde por meio das quais brotam a sabedoria que nos faz viver de forma maiêutica, numa condição existencial tal que procuramos extrair de nós quanto dos outros os mais ricos e íntimos atributos, virtudes e essências. Mesmo que a realidade que no rodeia seja medíocre, banal, ignóbil, o espírito da verdade pode domar nosso coração e nossa mente, nos fazendo tocar sem sermos tocados, e nos darmos sem que percamos nada do que possuímos.
A sabedoria da verdade ensina-nos falar para dizer o que se deve e calar-se ao mesmo tempo em que se fala, porque a palavra raciocina e reflete quando nela está subjacente o silêncio por trás dos sons, porque está exatamente no silêncio o segredo do verdadeiro e o mais importante significado secreto das palavras, pois elas se medem pela nobreza que não pronunciam.
É doseando a vida entre os silêncios e ruídos, que sabiamente nos ajustamos em nossa vida interior e exterior, pois vivemos num mundo de euforia frenética mesclada a balburdias, leviandades, algazarras e alvoroços, que perturbam o eu externo e nos afetam internamente. Portanto, a solidão e o silêncio acalmam a alma, e tal momento isola-nos ao alto, nos proporcionando elevação espiritual e intelectual, nos fazendo desejar os bens eternos, estes da sabedoria da verdade, como diz em provérbios que ela proclama-se nas ruas, nas praças e em todos os lugares, num apelo incessante por quem a ouça e a sinta, desejando dar amostras de sua simplicidade encantadora, exprimindo o seu eco em nós.
O fato é que, o quanto tanto tenho vivido, tanto mais tenho aprendido e cada vez mais tenho tão bem em mim discernido, o quanto tenho que de mim entender e aprender a viver.
A idade avança e o tempo é inexorável, inegociável e irrevogável.
Resta-me, portanto, empenhar-me ao máximo dar sentido a minha existência aqui nesta vida, e não questionar a vida o seu sentido, pois ela é tão somente dádiva divina, que para nós foi concedida, porquanto, ela é eximida por excelência de tal responsabilidade, não lhe é incumbida nenhuma explicação, justificação, interpretação sobre si mesma. A vida é verbo que se conjuga na primeira pessoa, ela é o EU que está subserviente aos meus comandos, volições, decisões e deliberações. Ela não pode ser terceirizada, o homem não pode se imbecilizar a tal ponto de alienar-se a si mesmo, pois a vida  por Deus nos foi concedida de forma individualizada e é livre-arbitrada.

Devo logo, então, sabê-la em mim, por mim e para mim e, como uma toupeira, devo cavar em meu interior túneis subterrâneos que irrompam minha superfície e adentrem no subsolo da minha existência, para encontrar ali meu ser subterrâneo, aquele imerso nos recônditos mais íntimos e profundos que oculta-se de mim na superfície do meu eu, este visível, corporal, social e intelectual. É uma escavação diária e contínua, abrindo hiatos subterrâneos em mim para um mapeamento interno, para que eu saiba conduzir minha alma ao Deus eterno.

O esforço incomensurável é diariamente transcender esse eu da superfície terrena, este tão supérfluo, desejante, pulsante, que é guiado por necessidades, emoções, ambições, intenções, motivos e objetivos. O sentido da vida está para muito além de uma vida terrena e superficial-corporal, pois em cada ser humano há um inconsciente espiritual, mas necessário se faz escavá-lo dentro de nós, e assim o faço em mim, para que eu sinta este Deus infinito por sobre mim, e Seu espírito dentro de mim.

Este  mundo é tal qual é,  em sua inexorável realidade factível. Com suas vicissitudes, superfluidades, banalidades, complexidades e contrariedades.
Não espero do mundo mais do que ele é e pode oferecer, apenas almejo minimamente alguma existência autêntica na qual meu ser espiritual possa fazer-se cada vez mais manifesto em mim.
Quando se almeja tal intento, paga-se um preço, pois é inevitável certa solidão espiritual e intelectual, porque passamos a ser “um corpo estranho” neste corpo social. Ser esse “corpo-estranho” é contrapor a aprovação desse corpo social. É ser passível de ser ridicularizado, rotulado, parodiado. 
Ninguém pertencente a este corpo social quer dele estar deslocado, isolado, para assim ser alvo de criticas e ofensas. A primazia da vaidade egocêntrica é preponderante nesta sociedade. Ninguém quer ser passível de hostilidades. Todos querem o afago, a bajulação, lisonjeiros. Todos querem o aplauso antes do espetáculo, porque a arrogância sempre é covarde. O egocêntrico evita as vaias e se escraviza pelos aplausos, porque ele é incapaz de encarar a si mesmo, porque a fonte de seus atributos é seu próprio ego, que corresponde a sua imanência.
O “corpo-estranho” tem por fonte de seus atributos a fé advinda de Deus, que por meio do espírito nos proporciona virtudes para a transcendência, para muito além dessa pífia vida medíocre de aparências.

Tenho aprendido com Deus que esse isolamento é na verdade uma honra que devemos apreciar e agradecer a Ele, pois significa uma condição particular íntima e exclusiva entre nosso ser indivíduo intelecto-espiritual para com o soberano Deus, que nessa intimidade nos revela e nos proporciona tudo aquilo que o vulgo saber humano é incapaz. 
O conhecimento humano limita-se em saber o que todos já sabem e tem possibilidade de saber, o divino é o esplendido extraordinário que nos transpõem para muito além do plano material. Está muito além da mera cognição intelectual, desse ser biopsicossocial, pois é revelação e inspiração espiritual, que nos torna em um ser biopsicoespiritual.

O espírito atua em nosso psíquico e nos faz entender nossa condição individual, fora desse senso comum social. Ele, o Espírito, portanto, é minha própria e única plateia, meu público, meu interlocutor. Ele não me aplaude e nem critica, mas me modifica, me edifica. Na medida em que essa particularidade intima com Deus acontece, mais ainda nos tornamos personalidades atípicas e estranhas a este mundo e, mais ainda, desenvolvemos uma legítima autoconfiança de entender que, não precisamos da aprovação alheia, mas unicamente de Deus.